Cleverson Siewert, titular de umas das pastas chaves do Governo de Santa Catarina, a Fazenda, tem em mãos um grande propósito: contribuir com a missão do Governador Jorginho Mello de honrar os compromissos assumidos com Santa Catarina. Para isto tem também grandes desafios, como equilibrar as contas públicas, aquecer a economia e avaliar, junto a demais órgãos, a continuidade de programas que impactam diretamente na vida das pessoas, como o Plano Mil, por exemplo. Nesta entrevista, exclusiva à Pelo Estado, Siewert fala do diagnóstico levantado dos últimos 10 anos e dos primeiros números de 2023, que mostram um cenário desafiador com a queda da arrecadação tributária e das transferências da União, e destaca a necessidade de ajuste das contas públicas. Entre os caminhos a seguir, ressaltou que o Governo não tem a intenção de aumentar impostos e avalia alternativas como benefícios fiscais, simplificação tributária, parcerias público-privadas e a busca de financiamentos. Confira a entrevista:
“Trabalharemos em um pacote de ações, conciliando as necessidades da máquina pública com a realidade de quem produz e faz a roda da economia girar. Jamais faremos algo de modo unilateral.”
PE: Secretário, o senhor já ocupou esta cadeira em 2010, depois passou quase 8 anos na presidência da Celesc e, em 2019, foi para a iniciativa privada. Agora retorna a capitanear a pasta mais importante do Executivo. Como o senhor avalia este desafio?
Cleverson Siewert – Construí minha carreira com base em experiências vividas tanto na vida corporativa quanto na vida pública. Durante 16 anos, essas experiências vieram de dentro da administração pública, quando enfrentei desafios e tive o privilégio de aprender e conviver com grandes profissionais que se tornaram verdadeiros professores nas mais diversas áreas e temas. Esse aprendizado e vivência que tive no passado, somados a um propósito que carrego junto comigo na vida profissional, me trouxeram de volta. E quando falo de propósito, me refiro a objetivos que vão além do óbvio. Explico isso com uma breve história: em 1962, o então presidente dos Estados Unidos, John Kennedy, fez sua primeira visita à NASA e, ao chegar, encontrou um homem limpando o chão. Ele se aproximou e perguntou o que aquele homem estava fazendo ali. “Estou ajudando o homem a ir à Lua”, respondeu. Aquele homem poderia ter dito outra coisa, mas ele tinha um propósito maior. E meu retorno ao Governo do Estado é um pouco disso. Quero ajudar o governador Jorginho Mello e toda a sua estrutura de governo a fazer ainda mais e ainda melhor por Santa Catarina. Hoje, me sinto mais preparado e pronto para os desafios que temos pela frente.
PE: A economia catarinense vem apresentando um desempenho acima da média brasileira desde 2016. Mas, em 2022 as perspectivas apontam um crescimento abaixo dos 8.3% de 2021. Para 2023 a estimativa é de uma desaceleração. O senhor disse que o Estado precisa ser um animador da economia. Qual a saída em um momento não tão favorável e com um déficit de R$ 128 milhões?
Siewert – O diagnóstico das contas estaduais produzido pela Secretaria de Estado da Fazenda analisou as receitas e despesas de Santa Catarina nos últimos 10 anos.
A análise deixou claro que há duas linhas de tendências bastante distintas. Uma delas, com números registrados de 2013 a 2019, apresenta-se muito mais regular. A outra, com dados de 2020 a 2022, mostra-se completamente atípica em razão da pandemia da Covid-19 e suas consequências. Esta atipicidade se traduziu em receitas extraordinárias, no volume de cerca de R$ 6 bilhões, que vieram, entre outros, de transferências do Governo Federal para o combate ao coronavírus, da dispensa do pagamento de R$ 1 bilhão referente às parcelas da dívida pública com a União em 2020, além do aumento da arrecadação tributária ocasionada pelo esforço fiscal. Aqui é importante destacar a influência de movimentos macroeconômicos vindos da inflação e do crescimento da economia (PIB). Em 2020, especificamente, o cenário também foi favorecido pelas medidas de contenção determinadas pelo Governo Federal – nesta lista estão a não possibilidade de aumento de salários, e o próprio lockdown. Mesmo diante destas circunstâncias absolutamente atípicas, diferenciadas e favoráveis economicamente a todos os Estados do Brasil, Santa Catarina encerrou 2022 com um déficit de R$ 128 milhões na chamada Fonte 100, que é de onde saem os recursos usados no pagamento de aproximadamente 65% das despesas estaduais. Para 2023, com a projeção de um cenário macroeconômico muito menos favorável e as despesas contratadas — em especial a folha de pagamento e as transferências aos municípios — prevemos um déficit de R$ 2,8 bilhões extras para honrar os compromissos assumidos em anos anteriores, além dos R$ 44 bilhões de previsão orçamentária. Diante deste contexto e sabendo que o Estado, a princípio, não deve contar com o aporte de recursos extraordinários da União neste pós-pandemia, a melhor saída é o ajuste das contas públicas.
A Secretaria de Estado da Fazenda está trabalhando na elaboração do PAFISC, que é o Plano de Ajuste Fiscal de Santa Catarina. O objetivo é mapear as despesas, com atenção especial aos contratos, gastos com a folha e metodologia usada nas transferências de recursos aos municípios. Pensando nas receitas, a intenção é estudar os benefícios fiscais, propor a simplificação tributária e firmar parcerias público-privadas, além da busca de financiamentos.
PE: Para honrar os compromissos assumidos, o estado precisaria ter em caixa mais R$ 2,8 bilhões. Sobre o Plano Mil, da gestão passada, o governador afirmou que será feita uma reanálise dos projetos. O Estado tem recursos disponíveis para continuidade dessas obras?
Siewert – A alocação de recursos por parte de qualquer governo se dá em relação a sua priorização. Portanto, qualquer Estado, município ou mesmo a União nunca terá recursos suficientes para todas as demandas existentes. Dado esse contexto e contando com um diagnóstico adequado por parte do Governo do Estado em relação a todas as obras contratadas ou acordadas com os municípios, a intenção do governador Jorginho Mello é promover um planejamento sobre todos esses investimentos. A intenção é garantir a continuidade das obras já iniciadas e verificar a viabilidade daquelas que ainda estão em fase de projeto. Mas o instrumento usado na transferência dos recursos deve ser revisto para garantir maior controle dos gastos do dinheiro público e atender às recomendações do controle externo, qual seja, Ministério Público de Santa Catarina e Tribunal de Contas do Estado. A expectativa do Governo do Estado, repassada aos prefeitos que vêm procurando informações sobre a continuidade das obras, é divulgar um novo cronograma de transferências a partir de março, tão logo seja concluída a elaboração do PAFISC e aprovada a sua implementação por parte do governador Jorginho Mello.
PE: Santa Catarina é reconhecida por ser um estado com um crescimento acima da média nacional em relação à empregos. O que a Secretaria da Fazenda pode fazer para fomentar a geração de mais vagas?
Siewert – O atual cenário macroeconômico nos mostra que temos grandes desafios pela frente, mas também nos mostra que podemos transformá-los em oportunidades. Um dos caminhos é fortalecer os nossos negócios, que passam pela indústria, pelo agronegócio e demais serviços com enorme potencial em nosso Estado. A indústria 4.0 já é uma realidade em Santa Catarina. Nossos negócios são extremamente competitivos e contam com um amplo repertório de inteligência artificial, internet das coisas, nanotecnologia, biotecnologia, automação e robótica. Temos um parque industrial reconhecido como um dos mais diversificados do país, presente em todas as regiões, que impulsiona nossos indicadores sociais e econômicos. O que pretendemos é desburocratizar, racionalizar e qualificar a gestão pública para que possamos ser cada vez mais competitivos, o que naturalmente implica na geração de emprego e renda.
PE: SC é o segundo estado mais competitivo do país segundo o ranking da CLP. Quais os principais desafios para manter esse status, considerando a concorrência entre os estados? Como a SEF pode contribuir nesse propósito?
Siewert – A visão de governo do governador Jorginho Mello vai além dos próximos quatro anos, projetando as próximas duas décadas. Nosso trabalho e de toda a administração estadual é pautado por um modelo de gestão sustentado em três pilares. O primeiro é formado pelas pessoas, que representam o principal ativo de qualquer organização. Elas precisam estar motivadas e preparadas. A combinação de tecnologia e inovação sustenta o segundo pilar, a partir da qualificação da execução dos gastos e da racionalização de processos para garantir entregas mais adequadas. O último pilar consiste na relação com a sociedade. Somos servidores públicos e servimos a 7,5 milhões de catarinenses.
O Ranking de Competitividade dos Estados, com dados de 2022, mostra que lideramos em termos de sustentabilidade social, segurança pública e eficiência da máquina pública. Mas temos enormes desafios em relação ao capital humano, por exemplo, que passa pela qualificação dos trabalhadores e do custo de mão de obra. São pontos a serem desenvolvidos e que estão contemplados no plano de governo.
PE: Nossa indústria teve um desempenho ruim em 2022, impactada principalmente pela retração do segmento têxtil e vestuário. Segundo estudo divulgado pela CNI, a participação da indústria brasileira no PIB passou de 36% (1985) para 11% (2021). E, enquanto em 1995, representava 2,8% da produção mundial, caiu para 1,3% atualmente. Como o governo pretende apoiar a indústria para que ela possa ser mais competitiva e superar gargalos?
Siewert – Apesar das dificuldades enfrentadas por todos os estados brasileiros, é importante destacar que a nossa indústria registrou o segundo maior crescimento do país na produção de alimentos no ano passado. O mercado de trabalho catarinense também teve desempenho positivo em 2022, com a abertura de 90,4 mil vagas formais na economia. Alcançamos, ainda, nosso maior fluxo de comércio internacional da história, em que a soma das exportações e das importações foi de US$ 41 bilhões no período.
Isto demonstra a valorização internacional dos produtos catarinenses, a diversificação de parceiros comerciais, a expansão das vendas de itens intensivos em tecnologia, com alto valor agregado e o nível de competitividade da nossa indústria, uma das mais pujantes do país. São dados que reforçam a importância do setor em nossa economia e o quanto ela contribui para o desenvolvimento de Santa Catarina.
Atendendo a pedido do próprio governador Jorginho Mello, vamos ouvir, dialogar e entender as demandas do setor produtivo catarinense. Trabalharemos em um pacote de ações, conciliando as necessidades da máquina pública com a realidade de quem produz e faz a roda da economia girar. Jamais faremos algo de modo unilateral. Nosso objetivo é impulsionar a competitividade de Santa Catarina. A Secretaria da Fazenda será o elo nesse ciclo virtuoso da economia catarinense.