Destaque

Exportação aquecida de grãos pode provocar crise na agroindústria

É uma situação contraditória. O Brasil é um dos maiores produtores de alimentos do planeta, mas, em razão da exportação acentuada de grãos, terá que importar essa mesma matéria-prima (soja, milho e arroz) – pagando preços maiores – para manter setores essenciais do agronegócio, como o seu gigantesco parque agroindustrial.

“Parece um contrassenso”, mostra o vice-presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Santa Catarina (Faesc) Enori Barbieri. “Estamos exportando grãos e importando esses mesmos grãos por preços maiores para produzirmos carnes e outros alimentos”.

Clique aqui e receba notícias de Chapecó e Região, do Brasil e do mundo pelo WhatsApp!

O ponto central dessa situação é que falta inteligência agrícola, pois o Brasil exporta comodities, beneficia os concorrentes no mercado mundial da proteína animal e ainda tem que comprar de outros países o que produz em abundância.

O caso mais emblemático é da soja. O Brasil é o maior produtor mundial, mas por questões de falta de planejamento e má administração, terá que importar esse grão para alimentar as cadeias produtivas da avicultura e da suinocultura e o sistema agroindustrial.

Ao atingir, neste ano, 123 milhões de toneladas e ultrapassar a potência norte-americana, o País tornou-se também o maior exportador de soja. Foram comercializadas para o exterior 80 milhões de toneladas da safra 2019/2020, das quais 60 milhões já foram embarcadas. O mercado está tão aquecido que 60% da safra brasileira 2020/2021 já está vendida no mercado internacional.

Os preços da soja expressam a que estágio chegou a valorização da oleaginosa. No início da colheita, em fevereiro, a saca de 60 kg estava sendo negociada com o produtor a R$ 85,00 mas, atualmente, está cotada no mercado interno a R$ 130,00.

As agroindústrias, as integradoras e os criadores já sabem que terão que importar soja, provavelmente dos Estados Unidos. Também já sabem que a soja estrangeira custará R$ 150,00 no porto, acrescentando-se a isso o custo da internalização do produto no território nacional. “Pela primeira vez na história recente do agronegócio brasileiro, o preço praticado no interior do Brasil estará acima da Bolsa de Chicago em razão da acentuada escassez do produto, ironicamente, na casa do maior produtor e exportador mundial”, assinala Barbieri.

O farelo de soja, obviamente, acompanha essa escalada. A tonelada já está sendo comercializada acima de R$ 2.000,00.

Milho e arroz

A situação do milho é muito idêntica à da soja. O planeta produz 1,1 bilhão de toneladas, estando a liderança com Estados Unidos (370 milhões de toneladas), o segundo lugar com a China (250 milhões), a terceira posição com o Brasil (100 milhões) e a quarta com Argentina (50 milhões).

A produção nacional da safra e safrinha colhidas em 2020 foi de 100 milhões de toneladas, para um consumo interno de 70 milhões de toneladas e exportação de 30 milhões de toneladas de milho. O preço pago ao produtor está em torno de R$ 50,00 a saca de 60 kg, mas o mercado prevê que subirá para R$ 65,00. Porém, já foram embarcadas 18 milhões de toneladas e os bons preços internacionais estão direcionando boa parte da produção para a exportação, como já ocorreu no ano passado.

Prevendo escassez, grandes consumidores – especialmente a indústria da carne e as cadeias de aves e suínos – já estão importando. O preço do milho para retirar no porto é de R$ 71,00 mais a operação logística de internalização.

A situação do milho (e também do farelo de soja) encarecerá o custo das rações para aves e suínos, aumentando o custo de produção dessas proteínas.

Mais curiosa é a situação do arrozum dos cereais mais consumidos do mundo. O consumo mundial na safra 2018/2019 foi de 494 milhões de toneladas. O maior produtor é a China e o Brasil fica em 11º lugar.

Dessa vez o Brasil terá que importar, fato que ocorreu pouquíssimas vezes na história. No ano passado, o País colheu 12 milhões de toneladas, mas, os preços ruins dos anos anteriores e a seca deste ano levaram à redução da área plantada (houve migração para soja) e a safra baixou para 10,4 milhões de toneladas.

Além da produção menor, a situação cambial estimulou a exportação de arroz industrializado para o México. No início da colheita, o produtor recebia R$ 45,00 pela saca de 50 kg, preço que evoluiu para R$ 100,00/saca. Entretanto, o mercado externo pagou melhor, razão pela qual o arroz brasileiro foi para o mercado mundial.

Resultado: faltou produto no mercado doméstico e será necessário importar porque a próxima safra só entra em fevereiro de 2021. Atentas a isso, as indústrias pedem a suspensão do imposto de importação (8%), mas os arrozeiros brigam pela manutenção do tributo.

Barbieri analisa que uma das explicações para acentuada valorização dos grãos é o abandono da política de estoques reguladores. Antigamente, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) mantinha estoques para intervir no mercado quando surgia alguma distorção grave nas relações concorrenciais. Nos últimos anos, a Conab somente participa quando os produtos primários são transacionados com nível abaixo dos preços mínimos – o que tornou-se difícil de ocorrer até mesmo porque os preços mínimos sempre estão desatualizados.

O vice-presidente da FAESC lamenta que a maior parcela dos ganhos não fique no campo. “Infelizmente, esses produtos agrícolas não estão mais na mão dos produtores rurais, portanto, quem está ficando com a maior parte desses ganhos são as tradings”. (MB Comunicação).

 

Artigos relacionados

DEIXAR UM COMENTÁRIO

Política de moderação de comentários: A legislação brasileira prevê a possibilidade de se responsabilizar o blogueiro ou o jornalista responsável por blogs e/ou sites e portais de notícias, inclusive quanto a comentários. Portanto, o jornalista responsável por este Portal de Notícias reserva a si o direito de não publicar comentários que firam a lei, a ética ou quaisquer outros princípios da boa convivência. Não serão aceitos comentários anônimos ou que envolvam crimes de calúnia, ofensa, falsidade ideológica, multiplicidade de nomes para um mesmo IP ou invasão de privacidade pessoal e/ou familiar a qualquer pessoa. Comentários sobre assuntos que não são tratados aqui também poderão ser suprimidos, bem como comentários com links. Este é um espaço público e coletivo e merece ser mantido limpo para o bem-estar de todos nós.
Botão Voltar ao topo

Adblock detectado

Por favor, considere apoiar-nos, desativando o seu bloqueador de anúncios